Cultura
MANIFESTO NEGRO
Janio Silva é estudante de Serviço Social, começou a escrever poemas influenciado pela cultura Hip Hop e também pelos escritores marginais Ferréz e Sergio Vaz. Os versos críticos e a realidade vivida pela grande camada populacional que vive a margem das condições básicas de vida são características da sua construção poética. Mantém uma pagina no facebook (https://www.facebook.com/LiteraturaMarginalES) onde pode ser encontrada um pouco mais literatura marginal escrita por jovens capixabas. Confira, abaixo, o poema “Manifesto Negro”:
Manifesto Negro
Senzalas, correntes,
lombos marcados pelo chicote do feitor,
passaram mais de 300 anos,
veio Lei Áurea, Alforria,
mas a ferida deixada não "cicatrizo”
o sonho de Luther King não se "realizô”
e ao invés do caráter,
ainda somos julgados por nariz, cabelo e cor,
por quem não imagina
ou sente o tamanho da nossa dor.
Dor concebida “deis” da partida de ti, ó África
dentro de um porão,
dor sentida na pele
pelos açoites da escravidão,
dor perpetuada
pela falsa abolição,
dor do âmago, dor do coração,
sentida por quem ainda é vítima da segregação.
Vítima das imposições
das Bulas Papais,
Vítima do tráfico negreiro
e a escravidão dos seus ancestrais,
Vítima de colonizadores brancos
que mostraram que nem sempre a cor branca traz a paz.
300 anos,
mais de 300 anos se passaram,
mas as feridas deixadas
não cicatrizaram.
Arrancaram-nos da nossa pátria,
na colonização utilizaram o trabalho escravo
dos teus filhos, ó Mãe África.
Após Lei Áurea, fomos expulsos das fazendas,
jogados nas ruas e praças.
A Lei de Terras,
a terras não nos deu acesso,
enquanto alguns poucos
concentraram terras em excesso.
Dos quilombos, os negros foram
para as favelas.
das senzalas, os negros foram para
os presídios, cadeias, celas.
Dos navios negreiros, os negros foram
para as viaturas.
Dos antigos métodos, os negros foram para
os novos métodos da escravatura.
Ocupando os altos índices
de pobreza, desnutrição e mortalidade,
ocupando poucos acentos
em órgãos públicos e universidades,
à margem da sociedade,
à margem da liberdade,
à margem da igualdade.
300 anos,
mais de 300 anos se passaram,
mas as feridas deixadas
não cicatrizaram.
Cabelo loiro,
branco ou branca, olho azul,
padrão de beleza europeu,
que se impõem do hemisfério norte ao hemisfério sul.
O etnocentrismo
institui uma horrenda ditadura,
em prol do embranquecimento,
demonizaram nossas crenças, nossos costumes,
demonizaram a nossa cultura.
As danças, as religiões,
o toque do berimbau, o batuque do tambor,
o rap, a capoeira,
o ritmo do agogô,
cultura “afro”
dita como inferior.
300 anos,
mais de 300 anos se passaram,
mas as feridas deixadas
não cicatrizaram.
Tentam nos manipular,
calar a nossa voz,
os meios de comunicação
nos apresentam falsos heróis,
Malcolm X, Zumbi,
heróis negros,
negros como muitos de “nóis”,
Luther King, Mandela, Dandara,
Anastácia, Steve Biko,
heróis e heroínas negras,
por muitos negros e negras desconhecidos.
Que lutaram pelo fim da escravidão
pelo fim da segregação, pelo fim do apartheid,
pela democracia racial,
pela liberdade,
pela igualdade.
Contra o racismo,
contra o preconceito, pelo respeito,
para que cada afrodescendente
tenha o orgulho de se declarar preto.
por direitos,
que não foram dados,
e sim conquistados,
com luta, resistência
e punhos cerrados.
300 anos,
mais de 300 anos se passaram,
mas as feridas deixadas
não cicatrizaram.
negros morreram, sangraram,
direitos conquistaram,
mas as lutas não terminaram.
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LicenÇa PoÉtica: Janio Silva
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