Cultura
A ARTE DE CLARICE LISPECTOR
 
 
'Ucrânia  Natalina': Coro Infantil Shchedrik apresenta folclore do Leste Europeu e  obras-primas barrocas (mp3, 95:21)
Um novo jeito de ler 
Clarice Lispector
A  escritora também transformava palavras em imagens deixando  fluir sua  busca infinita nas tintas que se aliavam aos veios da madeira.  É a  inquietude de escrever com pincel que Ricardo Iannace apresenta no   livro Retratos em Clarice Lispector, lançamento da Humanitas, em   co-parceria com a Editora da UFMG. Também a Edusp apresenta uma nova   edição de Clarice: uma vida que se conta, de Nádia Battella Gotlib
 Núcleo do fogo
na montanha de palavras
- desfia cor e ação .
desfia o fogo
desfila 
destila
coração
sacra e profana oração
Ler Clarice Lispector através de  suas pinturas. É  esse o desafio do leitor ao folhear as primeiras  páginas de Retratos  em Clarice Lispector ? Literatura, pintura e  fotografia, de Ricardo  Iannace, lançado pela Humanitas e Editora da  UFMG. São 18 imagens ? 17  em madeira de pinho-de-riga e apenas uma em  tela ?, que estão  arquivadas na Fundação Casa de Rui Barbosa.
Cada uma delas  tem algo para contar. Ver. Ou esconder.  Foram todas  pintadas em 1975.  Dois anos antes de morrer. Mas o que levava Clarice a  escrever  pintando ou pintar escrevendo? É esse questionamento que toca o  leitor  diante dos quadros e da vida. O mesmo questionamento que levou  Iannace a  pesquisar durante anos. O resultado foi a tese de doutorado  defendida  em 2004 na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas  (FFLCH) da  USP, que agora pode ser vista em livro.
Tocha ou vaso
no pódio da vida
- gritante vitória.
 A Gruta- detalhe
Como se não bastasse
a mágica das palavras
- Clarice pintava.
Alma de Clarice
a gruta espelha fiel
- Maravilhosa! 
Desenha o medo
provando ao seu filho:
No chão reluzenteo riscado da dança- mapa da alegria. Quem registrou
o rosto enigmático
- da bela  Clarice?
A mágica circular
de terras,ocres rosados
- arte de mestre
Iannace  percebeu o mundo da escritora saltando da madeira.
?São imagens   pequenas, feitas em chapas de pinho-de-riga, de espessura fina, que já   sofreram uma ligeira alteração?, explica. ?Duas delas trazem imagens na   frente e no verso e há aquelas que, na ausência de título, apresentam,   atrás, apenas a assinatura da autora de atravessado.?
Clarice, na   avaliação de Iannace, não tinha a intenção de mostrar a sua face de   pintora. Seus quadros não traziam nenhuma perfuração, gancho, nem foram   feitos para serem emoldurados.
?A impressão é que ela pintava como um   exercício, 
sem nenhuma pretensão.?
Só impressão.
- ela se transmutava
no turbilhão de cores. 
 Clarice - A gruta- detalheRompe da escuridão
o olhar camuflado
entre a folhagem.
  A professora da FFLCH  Nádia Battella Gotlib, que há anos estuda e  pesquisa a trajetória de  Clarice Lispector, observa as suas pinturas  como um mero passatempo.
?Uma tendência para deslocar-se cada vez mais  do figurativo, na  escrita, aproximando-se do ritmo e de sons puros,  desvinculados de  compromissos com a linha contínua do discursivo e da  história; e na  pintura, detendo-se em cores e linhas, com manchas  fortes. E construção  que indicia inquietação e turbulência interior.?
Só recentemente a crítica vem se  atendo
 à pintura de Clarice Lispector. 
 Clarice- A gruta- detalhe Basta este detalhede incrível beleza- Clarice imortal !
No palco azul
veste esbranquiçada
- respingos gritantes.
Mas,  exatamente para evitar que  esses quadros tenham a análise rigorosa de  uma obra de arte, o trabalho  de Ricardo Iannace traz uma nova dimensão  do trabalho da escritora. E  propõe uma análise inusitada no contexto da  literatura e também da  pintura e da fotografia.  Ou, como define Nádia  Gotlib, que assina a  apresentação do livro Retratos em Clarice  Lispector, é um novo jeito de  ler e apreciar o legado da escritora.
?A  leitura da arte abstrata em  Clarice e a partir de Clarice, 
Iannace faz  promovendo um diálogo  produtivo com teóricos e críticos como Giulio  Carlo Argan, Mel Goodin e  Charles Harrison?, explica a professora.
?O  repertório atento ao  movimento do próprio processo de linguagem  artística, desvinculado de  compromissos figurativos, desenvolve a  discussão sobre a forma do  retrato a partir da leitura de textos que a  própria Clarice traduziu e  adaptou.?A  capa do livro de Iannace traz um retrato inédito de Clarice Lispector:   um desenho pintado pelo poeta mineiro Otávio Dias Leite em abril de   1947.
Luta e pazO rosto azul
da noiva do tempo
-  esvoaça o véu carmim .
 Linhas e linhas ?  Iannace vai  buscando a admiração e a identificação de Clarice com a  pintura. Em A  descoberta do mundo, Clarice registrou:
 ?A verdade é que  simplesmente
 me  faltou o dom para a minha verdadeira vocação:
 a de  desenhar. 
Porque eu  poderia,
 sem finalidade nenhuma,
 desenhar e pintar  um grupo de formigas
  andando ou paradas
 ? e sentir-me inteiramente  realizada nesse trabalho.
  Ou desenharia linhas e linhas, 
uma cruzando a  outra, 
e me sentiria toda  concreta nessas linhas 
que os outros talvez  chamassem de abstratas?.
 
A bola de fogo
zanza na impotência
- de muitas cidades.
São  paisagens que aliam o abstrato e o figurativo.
Em cores fortes,   pinceladas soltas e o descompromisso com a forma, Clarice vai imprimindo   sensações como a do Medo, uma tela de maio de 1975 onde predomina o   preto e uma massa amarela que, segundo Iannace, é uma boca sem dentes   tentando gritar.
Explosão Fractal  ativoturbilhonante fecundo - a alma de Clarice Ou Perdida na vaguidão, também daquele mesmo mês, com   traços livres em tons terra.
Ave inquieta
nos vôos razantes 
- do olhar a terra.
O  título Tentativa de ser alegre é um desabafo e uma sugestão. Nesse   quadro, Clarice estampa Ulisses, cachorro que a acompanha nos seus   últimos anos de vida. O autor registra o depoimento de Clarice em Um   sopro de vida:
?Eu quase que já sei como será a minha morte.
 A sala   vazia, o cachorro a ponto de morrer de saudade. 
Os vitrais de minha   casa. 
Tudo vazio e calmo?.
Ela nasceu ciente 
da curta temporada
- urge poética.
O  vermelho pintado em círculos,  manchado com tinta preta. E uma legenda  onde há o nome do quadro Raiva e  rei[ndifi]ção, de 28 de abril de 1975,  como se fosse, na observação de  Iannace, uma lápide de sepultura.
Nesse quadro, Clarice sugere uma  explosão de movimentos circulares.  Iannace cita, nesse mesmo clima  lúgubre, Escuridão e luz: centro da  vida, com três velas brancas acesas  se projetando no meio do negro.
?Não  são quadros agradáveis de se olhar" 
?As  cores  são lúgubres
 e distribuem-se num feio carregado.
 Nem atraem pela   combinação de cores
 ou pelo ritmo do traçado das linhas. 
Impressiona a   carga pesada, funesta.?
Na mão da fada
o feio toca profundo
- brilha Macabéia. 
                             Porém,  nem tudo é sombra ou avesso.
Farol aceso
na mirabolante obra
  - descobre belezas.
Clarice registra momentos de sonho  em  Pássaro da liberdade, de junho de 1975, ou Ao amanhecer, de setembro  do  mesmo ano.
?Se comparados aos quadros já descritos, 
exibem motivos   ingênuos?.
?Enquanto em um aparece o traçado 
pouco   expressivo de uma gaivota azul,
 no outro se armam nuvens brancas   alvacentas 
ligeiramente azuladas.?
Uma mesma fonte ? Para  apresentar a escritora e  pintora na mesma tela, Ricardo Iannace ? como  define Aurora Fornoni  Bernardini, professora da FFLCH que o orientou  na tese de doutorado ?  traçou uma engenhosa trama entre os textos que  Clarice escreveu,  traduziu ou leu, onde estão presentes a arte do  retrato. O autor tem  como referência citações da escritora como:
?Antes  de mais nada, pinto  pintura. 
Acho que o processo criador de um pintor 
e  do escritor são da  mesma fonte.
 Quando eu escrevo, 
misturo uma tinta a  outra e nasce uma  nova cor?.
 Corpo e alma
rende-se à exigência
- ora escorre, ora evola.
 ?O  percurso é sabiamente construído?, analisa a professora Aurora.
?Parte  de uma crônica de Fundo de gaveta, de A legião estrangeira. Passa  pela  obra O retrato de Dorian Gray, que Clarice adaptou para o  português, e  pausa no quadro de Paul Klee, Paysage aux oiseaux jaunes,  que Clarice  admirou.?
Na análise sobre retrato e fotografia, Iannace  vai  buscar o estudo de especialistas como Susan Sontag, Roland Barthes e   Philippe Dubbois. ?Vozes entre outras que acompanham as de Platão e   Leibniz no momento da análise profunda de dois escritos fundamentais de   Clarice: A imitação da rosa e A quinta história.?
O que é o concreto e o abstrato é o questionamento que Clarice Lispector  deixa transparecer entre tintas e textos.
Altiva senhora
brinca de faz-de-conta
o tempo inteiro
O autor termina o livro  lembrando o diálogo na crônica intitulada Irmãos:
? Mas agora vamos brincar de outra coisa. Quero saber se o senhor é  inteligente. Este quadro é concreto ou abstrato?
? Abstrato.
? Pois o senhor é burro. É concreto: fui eu que pintei, e pintei nele  meus sentimentos e meus sentimentos são concretos.
Retratos em Clarice Lispector ?
 Literatura, pintura e fotografia, de  Ricardo Iannace, 
Humanitas e Editora da UFMG, 184 páginas, R$ 36,00.
Clara Clarice - clareira  fogosa
clareia a gente
Acompanhar  as reflexões e inquietações de Clarice Lispector,  pesquisar suas  histórias e o transcorrer de sua própria vida. Com essa  proposta, Nádia  Battella Gotlib, professora da Faculdade de Filosofia,  Letras e  Ciências Humanas (FFLCH) da USP, vem escrevendo artigos e  livros que  são uma referência nos estudos sobre a escritora.
Neste  mês, a Editora da  Universidade de São Paulo (Edusp) lança a sexta  edição de Clarice: uma  vida que se conta. ?Esse livro é o resultado de  uma experiência de  leitura dos textos de Clarice Lispector que procura  considerar sua  escrita a partir de uma via dupla?, explica Nádia.
?
Centra-se  nas suas  ficções por meio de abordagens críticas; detém-se em certos  dados de  caráter autobiográfico, desde que tenham eles ligação mais  direta com a  produção literária, no sentido de que possam contribuir  para sua  contextualização.?Nesta edição da Edusp (a anterior foi pela Ática, 
em 1995), Nádia  inseriu novos dados e notas.
?Incluí uma cronologia abreviada e  esquemática, para facilitar a  visualização de informações espalhadas ao  longo dos capítulos do livro.  E ampliei o repertório de imagens  acrescentando fotos e documentos  inéditos.?
Clarice: uma vida que se conta, 
de Nádia Battella Gotlib, Edusp, 656  páginas, R$ 62,00.
http://espaber.uspnet.usp.br/jorusp/?p=8340
 Publicado por admin - Segunda-feira, 15 Março 2010
LEILA KIYOMURA 
Sejam felizes todos os seres. Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.  
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