Deixar para trás o posto de queridinho da América é uma tarefa complicada. Para cada Leonardo DiCaprio e Brad Pitt, há vários Freddie Prinze Jr. ou Frankie Muniz. Quem? Alguns vão se perguntar. Bem, é exatamente esse o ponto.
DiCaprio, por exemplo, despontou como bom ator em ''Gilbert Grape'' (1993) e ''Diário de um Adolescente'' (1995), mas se transformou em paixão adolescente com o sucesso de ''Titanic'' (1997). Para se desvencilhar do estereótipo, passou a aceitar papéis em filmes mais ousados, com diretores respeitados como Woody Allen, Danny Boyle e, principalmente, Marin Scorsese, de quem se tornou parceiro habitual.
Seguindo os passos de Leo, Robert Pattinson, que se tornou ícone teen após viver o vampiro de ''Crepúsculo'', estrela ''Cosmópolis'', que chega amanhã aos cinemas do Estado. Dirigido pelo polêmico David Cronenberg (''Crash - Estranhos Prazeres'' e ''Marcas da Violência''), o filme difere de tudo o que se pode esperar de um trabalho estrelado por um galã juvenil. E isso é ótimo.
Com texto adaptado por Cronenberg a partir do livro homônimo de Don DeLillo, o roteiro acompanha um dia na vida de Eric Packer (Pattinson), um genial bilionário de 28 anos que decide atravessar a cidade para cortar o cabelo. Sua fortuna é fruto de suas apostas certeiras no mercado financeiro, mas hoje, ao contrário do que normalmente acontecia nos outros dias, Packer fez a escolha errada ao apostar contra o Yuan (moeda corrente da China) e, por isso, perde milhões a cada minuto que passa.
Em sua enorme limosine, adaptada para ignorar o ''mundo'' externo enquanto atravessa a cidade, ele recebe visitas de seguranças, consultores financeiros, médicos e outras de cunho sexual. A única pessoa que o faz deixar o veículo é sua esposa, tratada com tanta frieza quanto qualquer outro negócio.
Ao realizar um exame ''de rotina'' e descobrir que sua próstata é assimétrica (mesmo sem saber o que isso significa), Packer embarca em uma jornada de autodestruição e, por outro lado, humanização.
Narrativa Desde o início, ''Cosmópolis'' adota uma estrutura inusitada, com a limosine como pano de fundo para os excelentes diálogos de DeLillo. É irônico, no entanto, que o filme mais verborrágico de Cronenberg talvez seja também o que mais carece de uma linha narrativa convencional. Tal qual fez com os monitores de ''Videodrome – A Síndrome do Vídeo'' (1983), Cronenberg faz com que as janelas do veículo funcionem como visores da alienação. Dentro do carro, com isolamento acústico e à prova de balas, o mundo é outro.
Cronenberg faz um excelente trabalho ao adaptar os cenários absurdos e os diálogos nada verossímeis do texto original, de forma que ''Cosmópolis'' se assemelhe a um sonho. Sem qualquer preocupação com lógica ou geografia, personagens surgem e desaparecem sem nenhuma cerimônia, recurso que, em contrapartida, impede que o grande público se identifique com o texto.
Com Pattinson distante do papel de galã romântico que o consagrou, o filme encontra em seu protagonista uma forma de reforçar a crítica sobre os valores capitalistas. A distância que mantém de todos e a arrogância que sustenta fazem de Packer um sujeito fácil de ser odiado, mas, ao mesmo tempo, uma figura fundamental à condução da história.
Eric Packer era o papel que Pattinson precisava. Se há uma certeza no filme, inclusive para os fãs de ''Crepúsculo'' que vão ao cinema para ver o astro, é a de que ele sabe atuar. Estar ao lado de nomes como Paul Giamatti, em uma das cenas mais tensas do filme, e da sempre bela Juliette Binoche, é claro, não atrapalha. No fim, ''Cosmópolis'' é um filme fácil de ser odiado, mas não de ser ignorado.
Cosmópolis Drama. (Cosmopolis, França/Canadá/Portugal/Itália, 2012) Direção: David Cronenberg. Com Robert Pattinson, Paul Giamatti, Juliette Binoche e Sarah Gordon.