Jackson Libardi é estudante de Literatura e membro da CONFRARIA DOS BARDOS. Confira, abaixo, o conto “Piedade, Vandinho e um tal Baiano”:
PIEDADE, VANDINHO E TAL BAIANO
Fui até Piedade consolar a família do amigo defunto. Quase não conseguia acreditar que na noite anterior em que liguei pra ele, notei, no brando tom incomum da sua voz, de que ele não estava bem. Mas neguei a minha intuição e não perguntei nada. Agora está lá, morto. Enquanto eu podia ter dado uma palavra de conforto pra que ao menos minha própria consciência hoje estivesse mais tranquila.
A cabeça havia sido enterrada em cova rasa, foi só passar a mão para tirar a poeira; o corpo, submerso num valão. A mãe desconsolada como na maioria dos casos; abaixada, em prantos e soluços sondava com os olhos a superfície para ver se encontrava a outra parte que compunha o filho.
Disseram que as últimas horas passou na casa da Mãe Zilda, uma dona de centro espírita, ali mesmo de Piedade, próximo de onde o coitado foi vitimado. Parece que ela não tem ligação com o crime. Vandinho ficava lá bebendo, farreando, como ele mesmo costumava dizer. Quem matou mesmo todo mundo sabe. Foi o Baiano, um negrito tão ruim que até cometo uma redundância ao dizer. Não se sabe o motivo. Vandinho não usava drogas, não tinha envolvimento com tráfico, não mexia com mulher dos outros. Era um cara bacana, agradável. Tinha uma fraqueza sim, tomava as dores dos outros. Não era capaz de ver um inocente ou pessoa mais frágil apanhar, sem se intrometer. Talvez foi isso. Não sei.
Eu e o Plínio saímos tarde lá do bairro. Esperamos o corpo – que foi encontrado – ser levado ao IML, depois à funerária, e, por fim, voltar ao bairro pro velório. Ficamos lá fazendo o possível pra consolar a família. O corpo seria enterrado logo de manhã no dia seguinte.
Já era quase meia noite quando resolvemos ir embora. Os becos e ruas já estavam vazios, mas uma turma de mais ou menos uns cinquenta saíram de vez de uma quebrada, era o pessoal que estava assistindo o jogo do vasco e do flamengo. E entre eles estava o tal Baiano, sanguinário! Não sei como ninguém fazia nada. Deve que era chapa quente. Eu e o Plínio íamos entrar numa rua, mas como estava muito deserta, num ato meio que impensado resolvemos pegar a outra que estava movimentada, a de onde havia saído a galera, mas a maioria já havia se dispersado pelos becos. Só restavam uns três. E adivinha quem estava entre eles. O tal sujeito; mal encarado! Tivemos medo, claro, trememos, mas trememos o tremor que era a matiz de medo e ódio. Sabíamos que era ele; e, por azar, quando dei meia volta quase toquei no infeliz, e tremendo e puxando conversa ao mesmo tempo com o Plínio, saí pedindo desculpa ao dito cuja; quando ele parou, olhando pra mim brandindo os braços e dizendo pro parceiro em ar de deboche:
─ A culpa é minha?! A culpa é minha?!
Por pouco…