O VIDEOGAME COMO MÍDIA ARTÍSTICA
Cultura

O VIDEOGAME COMO MÍDIA ARTÍSTICA



Os videogames têm feito progresso espantoso em todos os sentidos. Henry Jenkins, um especialista no tema, afirma que, nos últimos 40 anos, eles saíram de pontos coloridos na tela para imagens com sofisticação cinematográfica, com duração de quase 100 horas de jogo. Hoje, os designers são influenciados a pensarem em jogos que possam ser mais profundos, e dessa ideia, de que os videogames são produções artísticas, surgiram debates que mudaram a forma de experimentar essa mídia, de diversificá-la em formato, conteúdo e audiência.

O estudo dos videogames

A pesquisa sobre os jogos de videogames começou a se desenvolver recentemente. O primeiro livro escrito inteiramente a respeito de videogames e seu uso como objeto de estudo, e não só como fonte de entretenimento, foi publicado em 1982, quando o pesquisador e desenvolvedor de jogos Chris Crawford dedicou-se a descrever e teorizar jogos de computador e consoles de videogames em The Art of Computer Game Design. A partir de então, o estudo dos videogames, da sua produção até o momento em que o jogador o joga, vem sendo feito de forma ampla no mundo inteiro e envolvendo várias áreas de conhecimento, por vários pesquisadores no campo das ciências sociais e médicas, da educação, da filosofia, da teoria literária e da arte estética. De acordo com Jason Rutter e Jo Bryce, a recente onda de estudos sobre videogames os faz pensar que a geração que jogou Atari e NES entrou na Universidade.

Os videogames hoje

Videogames não são hoje os mesmos que existiam no início da década de 1980, a tecnologia que eles utilizam evoluiu, assim como o poder de influência da mídia. Eles também não são apenas entretenimento infantil: de acordo com um levantamento de dados anual feito pela ESA (Associação de Softwares de Entretenimento), em 2012, 42% dos americanos tinham em média dois tipos de consoles de videogames em casa. A média de idade dos jogadores é de 30 anos; de todos os jogadores, 37% têm mais de 36 anos; 53% são homens, e ao citar os motivos para comprar jogos, eles elegem: “qualidade de gráficos e enredo interessante”. De acordo com o estudo, os jogadores que têm jogado mais nos últimos anos deixaram de jogar jogos de tabuleiro, de ir ao
cinema e de assistir filmes em casa. Numa média, esses jogadores têm jogado videogame por 12 anos. Nesses dados, não estamos citando os jogos de computadores, apenas os jogos de videogames.
Segundo o primeiro censo nacional para mapear o comportamento do jogador e o mercado de videogames no Brasil, o Censo Gamer 2012, 51% dos jogadores têm mais de 19 anos e 83% deles jogam com a família. Apenas 10% não têm os aparelhos em casa. Dentre as formas de se jogar um jogo digital, o aparelho de videogame no Brasil é uma unanimidade. Playstation 2 (41,2%) e Playstation 3 (40,5%) são os mais populares, entre eles estando apenas o XBOX 360 (40,9%).

Os videogames e a cultura

Scott Rettberg, que pesquisa a presença dos jogos em aulas de Literatura, declara que os jogos de computador ultrapassaram setores de entretenimento como os filmes de Hollywood, e que por isso seu conteúdo tem impacto e influência na cultura contemporânea. Teorias que têm sido aplicadas ao estudo de textos literários estão sendo utilizadas na investigação dos videogames também. Ele declara que “jogos de computadores e simuladores também têm um espaço na sala de aula de literatura, da mesma maneira que outros textos da cultura popular (filmes, televisão e letras de música de rock) estão sendo estudadas lado a lado com textos literários tradicionais”.
Grant Tavinor, outro estudioso do tema, concorda com Rettberg em relação à ideia de que os videogames vêm crescendo e se tornando mais importantes e fortes do que a indústria cinematográfica. De acordo com o autor, as vendas de jogos como Halo 3 e Grand Theft Auto IV no ano de 2007 ultrapassaram as de filmes e música pop, eclipsando os anteriores e tomando o lugar de mídias que eram predominantes no século XX.

Evolução tecnológica e artística em pesquisa

Os videogames têm sido matéria de discussões sobre arte e, nas universidades, acadêmicos vêm aceitando que os jogos sejam um tópico sério a ser investigado, de acordo com Henry Jenkins, não apenas como problema social, ou como desafio tecnológico, ou como fenômeno cultural, força econômica da indústria de entretenimento, mas como arte que evoluiu e que demanda concreta avaliação estética. Para Jenkins, o problema é que assim como muitas outras formas culturais relegadas como sem importância ou marginais, os videogames são vistos como uma forma de “poluição cultural", e que, na verdade, arte é aquilo que seja produzido por ou para uma parcela da população que seja, economica e ou financeiramente, elite.

Gilbert Seldes (1924), que visou a explicar que as primeiras contribuições culturais dos Estados Unidos surgiram de culturas populares (como o Jazz, de musicais da Broadway, do cinema de Hollywood e dos quadrinhos) tinha por objetivo mostrar aos leitores uma arte popular que era nova (e vista como “suspeita” e sem prestígio) em seu momento; ele quis mostrar que essas novas formas de cultura eram vivas e inovadoras, e desafiavam o que já havia sido estabelecido como forma artística legitimada.
Seldes recebeu críticas quando seu livro, Seven Lively Arts, foi publicado, porque se pensava. na época, que o cinema era uma mídia que tinha como foco o meio comercial e o avanço tecnológico, e que nenhuma das produções tinha valor artístico. Jenkins afirma que o videogame é visto dessa mesma maneira hoje. Porém, retomando Seldes, é importante lembrar que essa cultura popular deveria ser celebrada, porque estava intimamente ligada à cultura diária e contemporânea das pessoas, era uma forma democrática de arte que podia ser acessada pelo cidadão comum, porque fazia parte das experiências comuns. A máquina que na era industrial era desumanizante se transformara em matéria e fonte para expressão de visões, que faziam parte dos desejos, necessidades e fantasias humanas.
Para Jenkins, o que ocorre com a maioria do mercado de games, assim como com qualquer mercado, mas especificamente com o do cinema, é que existem produções de menor valor para sustentar o mercado e que são populares. Com o tempo, esse tipo de produto vai sustentar também as grandes empreitadas, aquelas que levam tempo demais para serem criadas e que são experimentações importantes para o avanço da tecnologia e da arte. Para o autor, é a crítica apurada sobre as expectativas artísticas das criações de designers de games que vão impulsionar o mercado a ser cada vez mais criativo.

(Texto de Adriana Falqueto Lemos publicado em C2+Caderno Pensar, do Jornal A Gazeta, páginas 8-9, no dia 25/05/2013)


Adriana Falqueto Lemos possui graduação em Letras Inglês pela Universidade Federal do Espírito Santo (2012). Atualmente, é bolsista da FAPES com projeto de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Letras da UFES com pesquisa intersemiótica entre videogame e literatura. Faz pesquisa principalmente nos seguintes temas: leitura, materiais didáticos, literatura, videogame e literatura de horror.



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